A importância da cláusula de sucessão no contrato social
Publicado em 08/01/2020
O Brasil é um dos campeões mundiais em burocracia quando se fala em abertura de empresa. Mesmo assim, somente em 2017 foram instaladas mais de 2,2 milhões de novas empresas no Brasil – a maioria do tipo “sociedade limitada”.
Ocorre que, devido à burocracia – aliada a custos relevantes – é comum que os futuros empresários conduzam os procedimentos para a abertura de forma independente (existem milhares de tutoriais e guias na internet) ou com a ajuda de um contador. A consequência prática disso é que a maioria dos Contratos Sociais arquivados nas Juntas Comerciais não foram elaborados ou sequer avaliados/validados por um advogado.
Segundo o clássico conceito de Clóvis Bevilaqua, contrato é um “acordo de vontades para o fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos” – e vale ressaltar que um contrato social é, para todos os fins, um contrato. Assim sendo, a disposição de vontade das partes é livre e aquilo que for definido pelas partes, desde que não afronte às previsões legais aplicáveis, deverá ser interpretado não só pelos contratantes, mas também por terceiros e pelo Judiciário.
Ressalta-se que a inexistência de regras específicas no contrato acaba por sujeitar a relação às regras gerais previstas em legislações aplicáveis, o que pode, por vezes, gerar resultados não desejados e onerosas discussões. Feita esta introdução sobre a relevância de ter um Contrato Social elaborado com foco nos interesses específicos dos sócios e da sociedade em si, é fundamental abordar a importância da definição de regras claras sobre a sucessão de cotas sociais no Contrato Social.
O Código Civil dispõe, em seu artigo 1028, que no caso de morte de sócio, sua quota será liquidada, salvo se o contrato dispuser diferentemente; se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.
Assim, não sendo aplicáveis as ressalvas listadas no artigo acima, as cotas do sócio falecido serão liquidadas (transformadas em valor monetário e incorporadas ao espólio do falecido para fins de sucessão de bens) e isso, a depender do tamanho da participação do sócio na sociedade, do valor das suas cotas e da saúde financeira da empresa, poderá comprometer a continuidade dos negócios.
Valendo-se do direito de ‘dispor diferentemente’ que é possível determinar, por exemplo, que em caso de falecimento ocorrerá o ingresso de herdeiros na sociedade – limitando de forma clara e expressa qual será a atuação e os direitos de gestão e voto de tais herdeiros ingressantes na sociedade.
Ainda poderá dispor sobre a participação dos herdeiros em Conselhos, Diretorias ou restringi-los à figura de mero sócio – com direito a dividendos e afins, mas sem qualquer poder de gestão efetiva ou interferência na condução dos negócios; ou que não haverá o ingresso de herdeiros, mas sim o pagamento a estes dos haveres do sócio falecido. Neste caso, a cláusula poderá estipular de forma detalhada como se dará a liquidação, ao estabelecer formas, prazos e condições de pagamento, exceções e ressalvas.
Em ambas as alternativas apresentadas fica evidente que a definição das regras não só evitará surpresas e litígios, mas também coordenará e conduzirá a sociedade na continuidade de suas atividades.
Por fim, saliento que esta é uma abordagem sobre uma questão problemática dentre inúmeras possíveis. Um Contrato Social bem redigido, pensado e negociado com atenção e foco nos interesses da sociedade e seus sócios, poderá influenciar diretamente a empresa, sua continuidade, solidez e sucesso.
Bruno Pacheco Ribas Beatriz é advogado, pós-graduando – LLM em Direito Empresarial Aplicado – Faculdades da Indústria (FIEP/PR) e sócio do Departamento Diretivo da Andersen Ballão Advocacia.
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