O cabimento da denúncia espontânea em matéria aduaneira
Publicado em 08/01/2020
Entende-se por denúncia espontânea, a autodenúncia, ou seja, a denúncia do próprio sujeito infrator que se adianta ao procedimento fiscal “confessando” o descumprimento de uma obrigação tributária ou administrativa, cumprindo-a e beneficiando-se pela exclusão das penalidades que lhes seriam aplicadas.
A denúncia espontânea em matéria aduaneira encontra-se positivada no art. 102 § 2º do Decreto-Lei nº 37/66, reproduzido no art. 683 § 2º do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6759/2009).
Antes de 2010, o § 2º do art. 102 era taxativo ao prescrever que a denúncia espontânea excluía apenas as penalidades de natureza tributária. Com o advento da Medida Provisória nº 497, de 2010, que foi convertida na Lei nº 12.350/2010, tal raciocínio, contudo, modificou-se.
Eis que referida Lei alterou o § 2º do art. 102 do Decreto – Lei nº 37/66 para retirar a expressão “somente as penalidades de natureza tributária” e incluir “a aplicação de penalidades de natureza tributária ou administrativa”, estendendo, assim, o cabimento do instituto para as penalidades de natureza administrativa. Nesse sentido:
Art.102 – A denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do imposto e dos acréscimos, excluirá a imposição da correspondente penalidade. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01/09/1988)
(…)
§ 2o A denúncia espontânea exclui a aplicação de penalidades de natureza tributária ou administrativa, com exceção das penalidades aplicáveis na hipótese de mercadoria sujeita a pena de perdimento. (Redação dada pela Lei nº 12.350, de 2010)
A própria lei específica ao tema foi alterada, portanto, para esclarecer de forma definitiva o cabimento da denúncia espontânea para as penalidades de natureza administrativa, restringindo a aplicação de referido instituto somente para as penalidades aplicáveis na hipótese de mercadoria sujeita a pena de perdimento.
O objetivo da alteração foi simplesmente estender o cabimento da denúncia espontânea para todas as penalidades, a exceção da pena de perdimento, inclusive para aquelas cuja natureza não é clara ou gera controvérsias, a exemplo das multas do Siscarga.
A própria Exposição de Motivos da Medida Provisória nº 497, de 2010 (que foi convertida na Lei 12.350, que altera o art. 102 do Decreto-Lei nº 37/66, sobre denúncia espontânea) leva a essa conclusão inexorável, senão vejamos:
(…) 40. A proposta de alteração do § 2º do art. 102 do Decreto-Lei nº 37, de 1966, visa a afastar dúvidas e divergência interpretativas quanto à aplicabilidade do instituto da denúncia espontânea e a consequente exclusão da imposição de determinadas penalidades, para as quais não se tem posicionamento doutrinário claro sobre sua natureza. (…) 47. A proposta de alteração objetiva deixar claro que o instituto da denúncia espontânea alcança todas as penalidades pecuniárias, aí incluídas as chamadas multas isoladas, pois nos parece incoerente haver a possibilidade de se aplicar o instituto da denúncia espontânea para penalidades vinculadas ao não-pagamento de tributo, que é a obrigação principal, e não haver essa possibilidade para multas isoladas, vinculadas ao descumprimento de obrigação acessória.” (Grifo nosso).
Importante destacar ainda que para que a exclusão da responsabilidade ocorra, tal qual há na denúncia espontânea em matéria tributária, deve-se, contudo, observar se não houve início de procedimento fiscal, mediante ato de ofício, escrito e, praticado por servidor competente, tendente a apurar a infração. Além disso, de acordo com a alínea “a” do § 1º do art. 102 do Decreto-Lei nº 37/66, também não considerará espontânea a denúncia apresentada no curso do despacho aduaneiro, até o desembaraço aduaneiro.
***Letícia Martins de França é advogada, Bacharel em Direito pela UniCuritiba, e integrante do Departamento Contencioso do escritório Andersen Ballão Advocacia desde 2009.
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