
Responsabilidade civil nas relações contratuais e extracontratuais
Publicado em 05/08/2025
*Gabriele Seabra Zanatta
Nas relações negociais estabelecidas entre empresas, a análise dos riscos jurídicos vinculados ao inadimplemento de obrigações ou à ocorrência de danos é essencial para a segurança das operações. A responsabilidade civil, neste contexto, pode ter origem tanto na violação dos dispositivos contratuais firmados entre as partes (responsabilidade civil contratual), quanto na infração a um dever legal, independentemente de relação contratual prévia (responsabilidade civil extracontratual). Essa distinção é relevante não apenas para a compreensão teórica da matéria, mas também, e sobretudo, para a adoção de medidas preventivas e reativas eficazes no ambiente corporativo.
A responsabilidade civil contratual se configura quando uma das partes descumpre, parcial ou integralmente, a obrigação assumida no contrato. Nesses casos, conforme disposto no art. 389 do Código Civil, o devedor responde por perdas e danos, acrescidos de juros, atualização monetária e honorários advocatícios. Nessa modalidade, a demonstração da culpa do devedor não se faz necessária: basta a prova do inadimplemento da obrigação contratual. Caberá ao devedor, se for o caso, afastar a responsabilidade mediante comprovação de alguma excludente, como o caso fortuito ou a força maior, conforme previsto no art. 393 do mesmo diploma legal.
É importante destacar que, mesmo nas hipóteses em que há um contrato entre as partes, deve-se observar o cumprimento de normas legais gerais, como os princípios da boa-fé objetiva e da probidade, cuja observância é exigida expressamente pelo art. 422 do Código Civil. Isso significa que os contratantes, ainda que respaldados por cláusulas específicas, não estão autorizados a agir de forma contrária à lealdade e à confiança recíproca. A inobservância desses deveres pode caracterizar infração apta a gerar responsabilidade, inclusive quando não houver descumprimento literal de cláusula contratual.
Em contraposição, a responsabilidade civil extracontratual pressupõe a existência de um ato ilícito praticado por uma das partes, com a consequente geração de dano a terceiro. Nessa hipótese, não há relação contratual direta entre o lesado e o agente causador do dano. De acordo com o art. 186 do Código Civil, aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito, sujeitando-se à reparação. Para que haja responsabilização, é necessário que o lesado comprove todos os elementos caracterizadores do dever de indenizar: a conduta ilícita, o dano experimentado, o nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo, e, por fim, a culpa do agente.
O que se extrai desse contraste é que a carga probatória imposta ao credor é significativamente distinta em cada uma das hipóteses. Na responsabilidade contratual, exige-se a simples comprovação do inadimplemento contratual. Já na responsabilidade extracontratual, o ônus da prova é mais amplo e rigoroso, cabendo ao lesado demonstrar todos os requisitos mencionados. Essa diferença prática pode ter impacto direto na condução de demandas judiciais ou arbitrais, na elaboração de cláusulas contratuais e na estratégia de gerenciamento de riscos empresariais.
Outro aspecto a ser considerado diz respeito à extensão da indenização. Embora contratos possam prever cláusulas limitadoras da responsabilidade, o art. 944 do Código Civil estabelece que a indenização deve corresponder à extensão do dano efetivamente sofrido. A norma também prevê uma exceção: caso haja desproporção excessiva entre a gravidade da culpa e a extensão do prejuízo, o juiz poderá reduzir a indenização de maneira equitativa. Tal prerrogativa judicial não deve ser ignorada, sobretudo quando se trata de contratos com previsões genéricas de limitação de responsabilidade que possam ser questionadas judicialmente.
No âmbito prático, a correta identificação da natureza da responsabilidade civil debatida também influencia a contagem dos prazos prescricionais aplicáveis, os quais variam de acordo com a tipificação jurídica da conduta lesiva. Trata-se de ponto que pode impactar diretamente a viabilidade do pleito judicial, sendo recomendável a análise técnica especializada para avaliação tempestiva das medidas cabíveis.
Independentemente da modalidade de responsabilidade, a controvérsia será submetida à análise judicial (ou arbitral, se assim convencionado), com base nas provas apresentadas e nos elementos jurídicos pertinentes. No caso da responsabilidade contratual, a demonstração do inadimplemento e do prejuízo poderá ser suficiente para viabilizar a indenização, salvo se comprovada excludente. Já na responsabilidade extracontratual, será necessário comprovar todos os elementos do ilícito. Em qualquer dos casos, a aferição do dano e sua extensão será fundamental para o cálculo da reparação devida.
Assim, a responsabilidade civil tem papel central na organização das relações empresariais. O assessoramento jurídico adequado, desde a fase pré-contratual até a execução das obrigações, contribui para a prevenção de riscos e litígios, além de fortalecer a posição da empresa em eventuais disputas. Empresas com múltiplas relações comerciais devem estar atentas a esses aspectos para adotar condutas preventivas e estratégicas.
*Gabriele Seabra Zanatta é advogada da Andersen Ballão Advocacia, especialista em Contencioso Cível.
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