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Quotas preferencias: um novo modelo de investimento nas sociedades limitadas

Publicado em 08/01/2020

Antes expressamente vedada, a emissão de quotas preferenciais por sociedades limitadas passou a ser autorizada após a publicação, em 02 de maio de 2017, da Instrução Normativa número 38 pelo Departamento de Registro Empresarial e Integração – DREI (órgão vinculado ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços e que regulamenta as Juntas Comerciais). O conceito de quota preferencial, até então inexistente no ordenamento jurídico brasileiro, faz analogia às ações preferenciais existentes no âmbito das sociedades anônimas. Neste tipo societário, as ações podem ser emitidas com características e direitos distintos, e em troca da concessão de algumas vantagens, podem ter direitos suprimidos, inclusive o direito a voto. As sociedades anônimas, desta forma, podem emitir ações ordinárias (sem preferências específicas e com direito a voto) e ações preferenciais – na maioria das vezes com preferência na distribuição de dividendos, mas sem direito a voto.

Importando o conceito ao modelo societário das sociedades limitadas, criou-se a quota preferencial, aproximando ainda mais os tipos societários de sociedades anônimas e de sociedades limitadas. A criação destas quotas viabiliza a formação dos mais diversos arranjos societários e de investimento, uma vez que alia a simplicidade estrutural da sociedade limitada, que outorga ampla liberdade aos sócios a um instrumento típico das sociedades anônimas, mais complexa, pensada para relações societárias mais robustas e que possibilita variadas alternativas para a captação de recursos.

Com a criação de quotas preferenciais é possível unir esta simplicidade de organização a uma estrutura jurídica que concede segurança para o investimento e governança da sociedade. Dentre as muitas disposições possíveis, citamos como exemplo a possibilidade de criação de quotas preferenciais com vantagens na distribuição de dividendos, determinando já no momento da sua criação qual será o critério utilizado para definição dos montantes a que cada quota fará jus, ao contrário do que ocorria antes nas sociedades limitadas, com a simples autorização à distribuição desproporcional do resultado entre os sócios.

Outra preferência que pode ser estabelecida é o direito à eleição de membros do Conselho de Administração, cuja criação foi expressamente autorizada nas sociedades limitadas pela mesma Instrução Normativa 38, a fim de se estruturar um segundo nível de controle e maior governança na sociedade. Desta forma, concede-se maior grau de confiança ao investidor, com um instrumento que formaliza e determina desde o início, no Contrato Social, os direitos a que cada espécie de quota fará jus.

Ademais, discute-se a possibilidade de restringir ou limitar o direito de voto de quotas preferenciais, assim como é facultado às ações emitidas conforme o art. 17 da Lei 6.404/76. A possibilidade não é tão clara, pois o Código Civil estabelece a grande maioria dos quóruns de aprovação pelas sociedades limitadas em um percentual do seu capital social, ao contrário do que determina a Lei das Sociedades Anônimas, que estabelece quóruns com base em percentual das ações com direito a voto. De toda forma, será necessário analisar o posicionamento dos Tribunais nacionais quando estes temas forem levados a sua apreciação para que possamos concluir quais serão os limites das restrições de direitos das quotas preferenciais admitidos, notadamente quanto à limitação ou supressão do direito de voto dos quotistas.

Sem dúvida, as quotas preferenciais estabelecem um novo instrumento de investimento nas sociedades limitadas, ampliando as possibilidades de estruturação do negócio para segurança do investidor e para garantir o controle da sociedade sem ingerência indevida.


Marina Novacki Dissenha é advogada do Departamento Corporativo da ABA e Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC/PR.

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